quinta-feira, 30 de junho de 2011

O sol da meia-noite

Há um ano tive quase essa experiência em São Petersburgo, na Russia, quando em Agosto ainda apanhei as românticas noites brancas. E já nessa altura fiquei impressionada.
Hoje não havia nuvens no céu e decidi ficar à espera da meia-noite. Sem relógio, sem pressas, sentidos despertos, com os olhos postos no céu. Vesti um casaco quente, despejei café a ferver numa enorme caneca e sentei-me a contemplar.
É um azul, um cinzento, um prateado. É um rosado pingado junto ao mar. É um amarelo torrado entre as nuvens. E as nuvens mestiças cinzentas e rosa. E lá ao fundo as montanhas. Brutas, pálidas, brancas, brilhantes, imperiais, soberbas, exageradas. E a neve, delicada e sensível. E o sol da meia-noite metediço. E é o mar adormecido, contemplativo. E eu. Eu e o silêncio. E aquele sol que me espia entre as nuvens. E o mar que me escuta os gemidos. E o vento que parece querer dançar. Haverá mais bela criação da natureza?

quarta-feira, 29 de junho de 2011

O Alaska e a estranha relação com os sapatos

Na primeira vez achei estranho. Chegámos a casa da Mara e do Ethan e havia um recado pendurado na porta com fita-cola: “take your shoes off before you enter!” Pensei que andavam em limpezas e assim o fizemos. Descalçámo-nos à porta. Entrámos e não havia sinal de limpezas. Coisa mais esquisita, estranhei.

No dia seguinte fomos convidados para uma festa de aniversário. Festa é festa e por isso arranjámo-nos à altura: bem vestidos, perfumados, arranjados, chegámos pontualmente e a porta estava entreaberta. Entrámos. “Hello! How are you?” Entre sorrisos e cumprimentos olho de soslaio para o chão e, no corredor da entrada, havia um mar de sapatos. Toda a gente descalça. Tivemos que tirar os nossos.

Embaraçosa situação. Gente com ar de festa, colares, perfumes, brincos, brilhos… Sem sapatos. Lá pude ver a meinha azul do dono da casa, a peúga de riscas do vizinho, a meia branca do ambientalista, os calos da juíza.

Hoje aconteceu o mesmo. Numa reunião de trabalho, um advogado recebeu-nos em casa e assim que abriu a porta, estremeci. Lá estava o raio do monte de sapatos no corredor a exigir a companhia dos nossos.

Eu até gosto de andar descalça, e até acho que tenho os pés bonitos mas como é que se consegue fazer uma entrevista ou manter uma conversa como deve ser, sem inibição ou desconforto com esta situação? Ou sem a sensação de que há um cheiro estranho no ar? Ou, pelo menos, sem ter a tentação de olhar para as meias dos outros, a ver quem tem o imprevisível, fatal e humilhante buraquinho na ponta do dedo?!




terça-feira, 28 de junho de 2011

Things about Alaska 8

Hey Mr. Moose!!!

Things about Alaska 7

It's a wild life out here...

Pessoa do Montenegro

O Andrija fez anos ontem. Era o nosso primeiro dia completo no Alaska e a coordenadora local, Mara, tinha preparado jantar para os bolseiros. Depois de uma semana em Washington, com os dezoito bolseiros europeus, agora, no Alaska, somos apenas cinco: o Andrija do Montenegro, o Lars da Dinamarca, o Laszlo da Hungria, o Lode da Bélgica e eu. Formamos um grupo maravilhoso. Hei-de falar sobre cada um deles. Por hoje, apenas o aniversariante.
O Andrjia é montenegrino. Com tudo o que isso implica. É diplomata e, pela história dos Balcãs, já representou vários países. Tratamo-lo por Ambassador, carinhosamente. Prefere Andrija, simplesmente.
Alto, reservado, atento, calado, às vezes quase parece arrogante. E ele assume-o. Extremamente culto, sabe imenso sobre o mundo inteiro e quase tudo sobre Portugal. Conhece as tascas, a cortiça, os queijos, não gosta do Algarve, lê e fala português. Ouve música portuguesa, também fado. Lê o Público, está em destaque no seu Ipod. Gosta de café. Lê de Saramago a Pessoa. É um Pessoano. Distingue os heterónimos, fez os percursos da Lisboa pessoana e já leu os ensaios de António Tabucci sobre Pessoa. Diz-se um lusitanófilo.
A Mara preparou-lhe um bolo especial de chocolate (que há muito por aqui no Alaska – e do bom) com os parabéns em montenegrino: Sretan Rondendan. E seis velas de criança, era o que havia à mão.
Dei-lhe os parabéns em português. Falei-lhe do Chiado. E da saudade.



Things about Alaska 6

Fiquei hoje a saber que os ursos do Alaska comem manga, o fruto, como prato de entrada. E comida de cão (sim, comida de cão, daquela que se vende nos supermercados) como prato principal. Para sobremesa, gostam de manteiga de amendoim.
O tratador disse também que os ursos do Alaska preferem as suecas.
Claro que me refiro aos ursos em cativeiro. Os verdadeiros não têm direito a menu tão amaricado. E aposto que preferem as portuguesas.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

domingo, 26 de junho de 2011

At the Capitol Hill, Washington D.C.



Grande dia. Interessantes conversas nos corredores do poder, em Washington. Tudo off the record. Pena...

Vai um Obama para Pequeno-Almoço?

Ainda pensei pedir um Obama Chili, mas como vinha com a família toda, achei melhor comer apenas um Donut. Foi no Kramerbooks de Dupont Circle (Washington DC).



sexta-feira, 24 de junho de 2011

Da série Futilidades Americanas 3

Em Washington não há Vodka Preta.

Da série Futilidades Americanas 2

As multas de trânsito por mau estacionamento em Washington custam 25 dólares.

Da série Futilidades Americanas 1

Washington não devia chamar-se Washington D.C. Mas sim Washington A.C.
Não há restaurante, loja, cantinho, sala, corredor, taberna, espelunca que não tenha Ar Condicionado. Ligado no máximo, por sinal.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

How do you say kiss in portuguese?

A sala tinha um cheiro esquisito, pouco agradável. As paredes eram amarelas. Quando chegámos havia umas quinze mulheres na sala. Sentadas. Umas jogavam às cartas, outras olhavam o homem lá ao fundo em cima de um escadote. Só uma fixava, entretida, o filme que estava a ser projectado na parede. Outras esperavam apenas que o relógio mostrasse as cinco e meia para atacarem a comida. Aos poucos a sala encheu. Uma adolescente de mini-saia. Uma grávida. Muitas mulheres idosas. Uma, sentada numa cadeira de rodas. Um homem vestido de mulher. Mais mulheres. Traziam sacos nas mãos, chinelos nos pés, olhar perdido. E fome.
Fazia parte do programa uma acção de voluntariado com pessoas sem-abrigo ou em situação de exclusão social e por isso fomos ao Thrive D.C., uma ONG num bairro hispânico de Washington. Trabalhámos na cozinha, cortámos pão, dobrámos roupa, lavámos louça, tratámos dos legumes, servimos refeições, limpámos as mesas.
Pediram-nos para nos apresentarmos: “olá, sou a Ana, venho de Lisboa, Portugal. Da Europa, lá do outro lado do Oceano!” Um aplauso tímido. “Ueu, the other side of the Ocean?!”. Uns quantos sorrisos.
Pude conhecer a Ilda. Veio da Jamaica. Óculos brancos. Um dente de ouro. Terá uns sessenta anos. Sorriso sereno, conformado com o que a vida lhe destina. “Tem filhos, Ilda?” – perguntei. “No, sweetheart, I have no one in this world”.
Pude conhecer Fatima. Tão bela e tão nova, que não se atreveu a dizer-me a idade. Teria uns desassete, dezoito anos. “Not Fátima. But Fatíma”, corrigiu-me. Contei-lhe a importância que em Portugal davam a Fátima. Sorriu. “Are you coming back here tomorrow?”
Pude conhecer a Odília, pesada, marcante, lenço africano na cabeça. “Who’s the girl from Portugal?”, perguntou ainda de estômago vazio quando estava na fila para receber a comida quente. E ensaiou o português: “Eu sou de Camarões. Cameroon, you know? Gosto de falar português!”
No final, despedi-me da Ilda, com dois beijos, deu-me um abraço apertado. E mais um abraço a Fatíma, que perguntou se voltaríamos a ver-nos. E a enorme Odília, que já estava junto à porta e voltou atrás para se despedir. “How do you say kiss in Portugal?”

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Banho de Europa

O francês apareceu despenteado. O romeno deixou-se dormir. Quando o grupo estava a sair do lobby do hotel, a grega lembrou-se que tinha deixado algo de essencial no quarto. A americana desesperava, olhando para o relógio. Saímos do hotel com quase dez minutos de atraso.
O percurso até à sede da Fundação que nos paga a Bolsa não é longe, por isso seguimos a pé. Uma correria, às 7.50h, pela Connecticut Avenue. Chegámos. Dez minutos atrasados, nós, os europeus. Mau. Muito mau… E mesmo assim faltava um, o italiano: não tinha conseguido o visto a tempo, só viria no dia seguinte.
O “Lecturer”, um académico de renome da American University, estava com ar de poucos amigos. Toda a gente sabe que os americanos odeiam esperar. Começou a sessão. O telemóvel do turco começou a tocar. O dinamarquês dormitava com jet lag. O francês continuava despenteado. O “Lecturer” ia falar-nos de valores, identidades, comparando americanos e europeus. Tinha ali um excelente mote.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Welcome to I-Washington

São mulheres bem vestidas com um na mão. São homens que correm na rua com um na mão. É uma criança de ascendência asiática sentada no chão entretida com um. Três jovens na esplanada, na Happy Hour, cada um com o seu. Não conversam, teclam e ouvem música. A Conferência, na sala de formação, é dada com um na mão.
Washington está rendida aos “I”: Iphones, Ipads, Ipods, I, I, I…
Aqui ninguém sabe o que é um Nokia? Nok-what? Inokia? A new Imodel? Sinto-me uma info-excluída.
Não há que enganar. Quem manda em Washington não é Obama. É o homem da Apple, Steve Jobs. E, que me perdoem os nova-iorquinos, Nova Iorque já não é a Big Apple. A verdadeira Big Apple é a cidade de Washington!

domingo, 19 de junho de 2011

Na América, à terceira

Já estive duas vezes nos Estados Unidos da América. Na primeira vez, em 2006, fui acompanhar uma visita do Presidente da República Cavaco Silva aos EUA. E na segunda, em 2008, fui como bolseira da FLAD (Fundação Luso-Americana), com uma bolsa de formação para jornalistas no Committee of Concerned Journalists em Washington D.C.
Esta é a minha terceira viagem aos EUA e a minha segunda Bolsa de Formação. Desta vez, vou como Bolseira da German Marshall Fund of the United States.
Começa aqui a minha mais profunda aventura americana.